Como já disse aqui, considero os artistas a elite da humanidade. Todavia, há artistas e artistas. Falo dos desprendidos, não dos mesquinhos. Dos verdadeiramente artistas. Os místicos também, me parece, fazem parte dessa nata da humanidade. E aqui também lembro que há os falsos. Fazer o quê? É preciso aprender a discernir. E incluo também os ativistas entre estes seres especiais. Chegam, trazem a Luz e depois de um tempo se vão, para iluminar outros mundos...
"Seres luminosos brilham mais onde é preciso de luz", diz a canção. Adoráveis criaturas.
Conheçam a ativista indiana Vandana Shiva, doutora em Física e em Filosofia da Ciência, que chama nossa atenção para o nosso crucial papel de cidadãos do mundo, na sociedade midiática e planetária.
"É preciso ter cuidado para não pintar a besta de verde", diz ativista
ANDREA VIALLI
A física e ativista indiana Vandana Shiva, uma das grandes vozes da atualidade sobre desenvolvimento sustentável, crê que a Rio+20 não será um fracasso, contrariando as previsões pessimistas.
A conferência se salvará não pelos acordos que serão firmados - que devem ser menos impactantes do que aqueles feitos na Eco-92 - mas pela força de pressão da sociedade e dos movimentos sociais, na visão dela.
"Conectadas como nunca, as pessoas farão a diferença no sentido de propor a construção de novos caminhos para o mundo", diz a ativista, que veio ao Brasil para participar do ciclo de palestras Fronteiras do Pensamento.
Crítica feroz da globalização e da biotecnologia, Shiva ressalta que os governos estão apáticos nas principais convenções ambientais (clima, biodiversidade) por causa dos avanços dos grandes grupos transnacionais e seus lobbies poderosos, os quais, mais do que nunca, influenciam as decisões dos governos.
Aqui, ela fala dos riscos do conceito de "economia verde", foco da conferência.
A ativista indiana Vandana Shiva, 59, que veio ao Brasil para fazer palestras sobre temas da Rio+20 Fábio Braga/FolhaPress |
Folha - A sra. virá à Rio+20?
Vandana Shiva - Sim, chego no dia 17 de junho para os painéis que estão sendo preparados pelo governo brasileiro. Um deles é sobre segurança alimentar e energética. Uma das grandes mudanças da Rio+20, em relação à Eco-92, da qual também participei, é que agora a agricultura está no centro das discussões. Especialmente a agricultura tradicional, que ganha importância como uma questão ecológica. Também farei parte de várias atividades na Cúpula dos Povos, com o objetivo de acordar os líderes.
Em 1992, a agenda era bem clara: incluir a proteção da natureza entre as obrigações da comunidade internacional. Daí surgiram as principais convenções, como a do clima e da biodiversidade, e também os Princípios do Rio, que foram um balizador das leis ambientais no mundo todo. Mas a agenda da Rio+20 está difusa por um motivo claro: a ascensão, nos últimos anos, do poder das grandes corporações multinacionais.
As empresas estão influenciando as decisões globais sobre ambiente?
Sem dúvida, e não para o bem. A ascensão do poder das grandes empresas se deu em razão dos acordos de livre comércio da OMC (Organização Mundial do Comércio). Esses acordos permitiram amplo acesso das empresas aos recursos naturais e estão ajudando a desregulamentar o que foi duramente regulamentado durante a Eco-92. Desde então, as multinacionais estão destruindo o futuro da humanidade. Foi por causa delas que não há avanços nas negociações de clima, por exemplo.
E mudanças climáticas não estão na agenda da Rio+20.
Não há progressos nessa área desde a conferência de Copenhague. Depois vieram os encontros de Cancún e Durban, sem resultados efetivos. Por causa do lobby das grandes corporações, os países estão "desregulamentando" o que havia sido regulamentado antes.
A sra. poderia dar exemplos dessa "desregulamentação"?
O Brasil é um exemplo, veja o que ocorreu com os transgênicos. Quando eu vim pela primeira vez ao Rio Grande do Sul, a convite do José Lutzenberger [ex-ministro do Meio Ambiente], havia um forte movimento dos agricultores contra as sementes geneticamente modificadas.
Agora os campos estão cobertos de soja transgênica. Isso é parte da mudança trazida pela globalização, da tomada do poder pelas multinacionais que são contrárias a qualquer acordo ambiental.
Os setores mais nocivos são as empresas de combustíveis fósseis, os gigantes do agronegócio e da biotecnologia. O Canadá era um país progressista na Eco-92 e agora está paralisado nas negociações ambientais por causa das empresas que exploram óleo nas areias betuminosas.
Como tornar a conferência relevante?
A resposta está nas pessoas. É por isso que a Cúpula dos Povos é tão importante. Serão as pessoas e os movimentos sociais que vão impor uma nova agenda para a humanidade. Conectados como nunca, as pessoas farão a diferença no sentido de propor a construção de novos caminhos. Veja o movimento "Occupy", por exemplo.
Outra discussão da Rio+20 será a formulação de novos indicadores econômicos. A sra. acompanha esse debate?
Sim, e fico feliz que muitos economistas "mainstream", como Joseph Stiglitz, estejam empenhados nesse debate. Mas o que não podemos é transformar a natureza em commodity. Devemos valorar a natureza, mas não transformar o ar, a água, as florestas em mercadorias.
Esse é um dos riscos do conceito de economia verde. Ele não é ruim em essência, mas o que me preocupa é se essa não será mais uma manobra para os poderosos saquearem os recursos naturais em nome dessa "nova economia". Temos de ter cuidado para não pintar a besta de verde.
RAIO-X
QUEM É
Ambientalista e feminista, ficou famosa nos anos 1970 ao se amarrar em árvores para impedir seu corte [essa é das minhas!!!], criando o movimento Chipko.NASCIMENTO
Dehradum, na Índia, em 1952.
ATUAÇÃO
Diretora da Fundação de Pesquisa em Ciência, Tecnologia e Ecologia, em Nova Déli, na Índia.
Folha Online
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