Tradutor

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

O bispo vermelho e a presidenta guerrilheira

Hoje li um post no blog Terra Brasilis, do meu amigo, editor e compadre DiAfonso, onde ele homenageia Dom Helder Câmara, que teve a honra e a graça de conhecer pessoalmente, e que faria hoje 102 anos. Fiquei com uma "inveja boa" do meu compadre-blogueiro, pensei em reproduzir o post aqui no ABC!, e acabei buscando mais leituras sobre esse santo na internet.

A lembrança de Dom Helder, combatente incansável pelos direitos humanos e pelos mais pobres, também na época da ditadura, tem tudo a ver com esse momento que vivemos, com um governo popular de uma presidente mulher que ajudou a derrubar o regime de exceção e que hoje reafirma em seu governo compromissos com os direitos humanos e erradicação da pobreza e miséria, tão caros a ela e ao "bispo vermelho".

Estivesse vivo, acredito que Dom Helder arregaçaria as mangas e estaria lado a lado com a presidenta Dilma nessa luta.

Abaixo, reproduzo um belo texto de Frei Betto, onde ele homenageia nosso Mahatma (Grande Alma). E recomendo aos leitores o post carinhoso do Terra Brasilis.



O legado de Dom Helder Câmara


O arcebispo Dom Helder Câmara (1909-1999) é figura singular na história da Igreja Católica no Brasil. Diminuto, magérrimo, poucos o superavam em oratória: adornava as ideias com gestos efusivos e um senso de humor incomum ao se tratar de bispos. Por onde andasse, lotava auditórios: Paris, Nova York, Roma... Entre os anos de 1960-80, apenas dois brasileiros gozavam de ampla popularidade no exterior: Pelé e Dom Helder.

Tamanho o carisma dele que, em 1971, em Paris, convidado a falar num salão capaz de comportar 2 mil pessoas, tiveram que transferi-lo para o Palácio de Esportes, que abriga 12 mil.


Hábitos simples

Conheci-o em 1962, ao chegar ao Rio, vindo de Minas, para integrar a direção nacional da JEC (Juventude Estudantil Católica). Dom Helder era bispo-auxiliar da arquidiocese carioca e responsável pela Ação Católica. Vivia de seu salário como assessor técnico (aprovado em concurso público) do Ministério da Educação, morava modestamente, almoçava em botequim – ou melhor, beliscava, pois a vida toda comeu como passarinho – e subia as favelas como quem se sente em casa, sempre trajando batina, hábito mantido por toda a vida, mesmo quando o Concílio Vaticano II (1962-1965) permitiu aos clérigos saírem à rua em trajes civis.

Desde seus tempos de seminarista em Fortaleza – nascera em Messejana, hoje bairro da capital cearense – Dom Helder cultivava hábitos incomuns: deitava-se por volta das dez ou onze da noite, levantava-se às duas da madrugada, trocava a cama por uma cadeira de balanço, na qual orava, meditava, lia e escrevia cartas e poemas. Todos os seus livros foram concebidos naquele momento de “vigília”, como dizia. Às quatro retornava ao leito, dormia por mais uma hora para, em seguida, celebrar missa e iniciar seu dia de trabalho.

Com frequência Dom Helder visitava a “república” das Laranjeiras, onde se amontoavam os estudantes dirigentes da JEC e da JUC (Juventude Universitária Católica). Betinho (Herbert Jose de Souza) e José Serra, líderes estudantis, encontravam ali hospedagem garantida ao vir de Minas ou São Paulo.

Era Dom Helder quem nos assegurava, graças a seus relacionamentos em todas as camadas sociais, passagens aéreas pelo Brasil, bolsas de estudos, e até alimentação. Na época, o governo dos EUA, preocupado com a ameaça comunista na América Latina (sobretudo após a vitória da Revolução Cubana), lançara a campanha “Aliança para o Progresso”, que consistia, basicamente, em remeter alimentos às famílias miseráveis.

Para socorrer-nos da penúria na “república”, Dom Helder, responsável pela distribuição dos donativos, nos enviava caixas de papelão contendo o que denominávamos “leite da Jaqueline” e “queijo do Kennedy”. Como os produtos ficavam meses no porto, sujeitos ao calor carioca, vários de nós tivemos problemas de saúde por ingeri-los.


Senso de oportunidade

O maior sonho de Dom Helder era a erradicação da miséria no mundo. Sonhava com o ano 2000 sem fome. Ainda no Rio, criou o Banco da Providência e a Cruzada São Sebastião, no intuito de pôr fim às favelas. Graças a doações, edificou no Leblon um conjunto de prédios, para cujos apartamentos transferiu famílias de uma favela próxima. Não deu certo. Sem recursos para pagar os impostos (luz, água, telefone...), os moradores passaram a sublocar os domicílios e a obter renda graças à venda de torneiras, pias e outras peças do imóvel.

Para angariar recursos a suas obras, Dom Helder não titubeava em comparecer a programas de auditório de grande audiência televisiva. Certa ocasião, foi convidado por um apresentador para sortear prendas expostas no palco e vistas por todos, exceto pela pessoa trancada numa cabine opaca. Calhou de ser um desempregado. “Seu Joaquim, o senhor troca isto por aquilo?” E sem nomear o objeto, Dom Helder apontava um liquidificador e, em seguida, um carro. Seu Joaquim respondia “sim” e toda a platéia vibrava. Em seguida, Dom Helder indagou se trocava o carro por um abridor de latas. O homem topou. E não mais arredou pé, cismou que escolhera a melhor prenda. Ao sair da cabine, recebeu dos patrocinadores, decepcionado, o abridor. E Dom Helder mereceu um polpudo cheque. O arcebispo não teve dúvidas: “Seu Joaquim, o senhor troca este cheque pelo abridor?”

No dia seguinte, no Palácio São Joaquim, onde funcionava a cúria do Rio, criticamos Dom Helder por ter aberto mão de um recurso que poderia reforçar suas obras sociais. Ele justificou-se: “Perdi o cheque, ganhei em publicidade. Esperem para ver quanto dinheiro vou angariar.”


Visão empreendedora


Homem carismático, dotado de forte espírito gregário, era difícil alguém – incluído quem o criticava – não se deixar envolver pela energia que dele emanava no contato pessoal. JK quis que se candidatasse a prefeito do Rio. Dom Helder jamais aceitou meter-se em política partidária; bastava-lhe, como lição, o erro de juventude, quando demonstrou simpatia pelos integralistas.

Por sua iniciativa, foram fundados, em 1955, o CELAM – Conselho Episcopal Latino-Americano -, que congrega e representa os bispos do nosso Continente, e a CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, pólo articulador dos prelados de nosso país, do qual ele foi o primeiro secretário-geral.


Bispo vermelho

Numa época em que não havia Igreja progressista nem Teologia da Libertação, Dom Helder, graças à sua sensibilidade social e sua opção pelos pobres, era tido por comunista, difamação acentuada após a implantação da ditadura militar no Brasil, em 1964. Costumava comentar: “Se defendo os pobres, me chamam de cristão; se denuncio as causas da pobreza, me acusam de comunista”.

Nomeado arcebispo de São Luís (MA) no mesmo mês do golpe, antes de tomar posse o papa Paulo VI o transferiu para Olinda e Recife, onde permaneceu até morrer.

Em 1972 o nome de Dom Helder despontou como forte candidato ao Prêmio Nobel da Paz. Há fortes indícios de que não foi laureado por duas razões: primeiro, pressão do governo Médici. A ditadura se veria fortemente abalada em sua imagem exterior caso ele fosse premiado. Mesmo dentro do Brasil Dom Helder era considerado persona non grata. Censurado, nada do que o “arcebispo vermelho” falava era reproduzido ou noticiado pela mídia de nosso país.

A outra razão: ciúmes da Cúria Romana. Esta considerava uma indelicadeza, por parte da comissão norueguesa do Nobel da Paz, conceder a um bispo do Terceiro Mundo um prêmio que deveria, primeiro, ser dado ao papa...

No Recife, Dom Helder lançou a Operação Esperança: promoveu reforma agrária nas terras da arquidiocese; passou a visitar favelas, mocambos e bairros pobres; estreitou laços com artistas, universitários e intelectuais.

Graças ao seu poder de articulação e carisma profético, em 1973 bispos e superiores religiosos do Nordeste fizeram ecoar a primeira denúncia cabal à ditadura feita por católicos: o manifesto “Ouvi os clamores de meu povo”. O documento, recolhido pela repressão, foi divulgado através de edições clandestinas mimeografadas.


Homem de fé

Um dia, o governo militar, preocupado com a segurança do arcebispo de Olinda e Recife, temendo que algo acontecesse a ele – um atentado ou “acidente” - e a culpa recaísse sobre o Planalto, enviou delegados da Polícia Federal para lhe oferecer um mínimo de proteção. Disseram-lhe: “Dom Helder, o governo teme que algum maluco o ameace e a culpa recaia sobre o regime militar. Estamos aqui para lhe oferecer segurança”.

Dom Helder reagiu: “Não preciso de vocês, já tenho quem cuide de minha segurança”. “Mas, Dom Helder, o senhor não pode ter um esquema privado. Todos que dispõem de serviço de segurança precisam registrá-lo na Polícia Federal. Esta equipe precisa ser de nosso conhecimento, inclusive devido ao porte de armas. O senhor precisa nos dizer quem são as pessoas que cuidam da sua segurança.”

Dom Helder retrucou: “Podem anotar os nomes: são três pessoas, o Pai, o Filho e o Espírito Santo.”

Dom Helder morava numa casa modesta ao lado da igreja das Fronteiras, no Recife. Frequentemente, as pessoas que tocavam a campainha eram atendidas pelo próprio arcebispo. Certa noite, a polícia fez batida numa favela da capital pernambucana, em busca do chefe do tráfico de drogas. Confundiu um operário com o homem procurado. Levou-o para a delegacia e passou a torturá-lo.

Pela lógica policial, se o preso apanha e não fala é porque é importante, treinado para guardar segredos. Vizinhos e a família, desesperados, ficaram em volta da delegacia ouvindo os gritos do homem. Até que alguém sugeriu à esposa do operário recorrer a Dom Helder.

A mulher bateu na igreja das Fronteiras: “Dom Helder, pelo amor de Deus, vem comigo, lá na delegacia do bairro estão matando meu marido a pancadas.” O prelado a acompanhou. Ao chegar lá, o delegado ficou assustadíssimo: “Eminência, a que devo a honra de sua visita a esta hora da noite?”

Dom Helder explicou: “Doutor, vim aqui porque há um equívoco. Os senhores prenderam meu irmão por engano.” “Seu irmão?!” “É, fulano de tal – deu o nome – é meu irmão”. “Mas, Dom Helder – reagiu o delegado perplexo -, o senhor me desculpe, mas como podia adivinhar que é seu irmão. Os senhores são tão diferentes!”

Dom Helder se aproximou do ouvido do policial e sussurrou: “É que somos irmãos só por parte de Pai”. “Ah, entendi, entendi.” E liberou o homem.

De fato, irmãos no mesmo Pai.


Perseguições e direitos humanos

Durante o regime militar, Dom Helder moveu intensa campanha no exterior de denúncia de violações dos direitos humanos. O governador de São Paulo, Abreu Sodré, tentou criminalizá-lo. Alegava ter provas de que Dom Helder era financiado por Cuba e Moscou. Alguns bispos ficavam sem saber como agir, como foi o caso do cardeal de São Paulo, Dom Agnelo Rossi, amigo do governador e de Dom Helder. Não foi capaz de tomar uma posição firme na contenda. Mais tarde a denúncia caiu no vazio, não havia provas, apenas recortes de jornais.

Incomodava ao governo ver desmoralizada, pelo discurso de Dom Helder, a imagem que ele queria projetar do Brasil no exterior, negando torturas e assassinatos. Dom Helder ressaltava que, se o governo brasileiro quisesse provar que ele mentia, então abrisse as portas do país para que comissões internacionais de direitos humanos viessem investigar, como havia feito a ditadura da Grécia.

Se hoje, na Igreja, se fala de direitos humanos, especificamente na Igreja do Brasil, que tem uma pauta exemplar de defesa desses direitos, apesar de todas as contradições, isso se deve ao trabalho de Dom Helder. Nenhum episcopado do mundo tem agenda semelhante à da CNBB na defesa dos direitos humanos. A começar pelos temas anuais da Campanha da Fraternidade: idoso, deficiente, criança, índio, vida, segurança etc. Neste ano de 2010, economia. Isso é realmente um marco, algo já sedimentado. Também as Semanas Sociais, que as dioceses, todos os anos, promovem pelo Brasil afora, favorecem a articulação entre fé e política, sem ceder ao fundamentalismo.

A Igreja Católica e o Brasil devem muito a Dom Helder Câmara, que desclandestinizou a pobreza existente em nosso país e induziu poder público e cristãos a encarar com seriedade os direitos dos pobres à vida digna e feliz. O profeta nascido em Messejana foi, sim, um autêntico discípulo de Jesus Cristo.

Frei Betto

Cidadão Lula fala para o mundo

O cidadão do mundo Luiz Inácio Lula da Silva, que participa em Dakar, no Senegal, da 11a. edição do Fórum Social Mundial, discursou hoje criticando países e líderes do G-20, grupo dos países mais ricos, e afirmando que a África precisa de oportunidades, não de ajuda.

Abaixo alguns trechos do pronunciamento do ex-presidente.

"Não pensem que lá [G-20] tem sensibilidade para o problema da fome, para os pobres do mundo. Só fomos chamados para as reuniões dos países ricos porque eles estavam em crise e precisavam da nossa ajuda."

"No Fórum nos reunimos para dizer que um outro mundo é possível e necessário. Esse é um sonho que não vamos abandonar nunca.”

“É cada vez mais forte a consciência de que o Consenso de Washington faliu. Aqueles que com arrogância nos davam instruções não evitaram a crise. Hoje somos parte essencial e incontornável da solução da crise internacional.”

"Até recentemente predominava a tese de que o desenvolvimento só era possível para uma pequena fatia da população, qualquer esforço para afrontar a pobreza era visto, e ainda o é, como assistencialismo e populismo. A história está se encarregando de desmentir essas teorias. Felizmente já não predomina a tese do estado mínimo, mas não podemos substituir um neoliberalismo que faliu por um nacionalismo primitivo e autoritário.”

“É hora de colocar o desenvolvimento e a democracia no centro da agenda africana e mundial.” 

"Não há soberania real sem soberania alimentar."

“Nos 29 países que visitei como presidente constatei a vitalidade com que esse continente irmão afirma seu desenvolvimento, sem ingerências externas e com democracia.”

“A África tem um futuro extraordinário, e esse futuro está chegando.”

Lula voltou a se desculpar pela escravidão no Brasil, como já havia feito em 2005. E pediu o reconhecimento de um estado palestino que seja “economicamente viável, socialmente integrado e que esteja em paz com Israel”.

“Mais do que ajuda, a África precisa de oportunidade.”

Apagão, Blecaute, Lambança do Diabo...

Escuridão, Queda de Energia, Interrupção, Desligamento automático...

O nome pouco importa.

Oito estados do Nordeste, 46 milhões de pessoas, ficaram às escuras por várias horas na madrugada de sexta-feira, 4. Milhares não puderam dormir pelo calor e pernilongos, pois não havia como ligar ar condicionado e ventiladores.

Problemas em hospitais, presídios, aeroportos, trânsito... Assaltos, ameaças de violência, clima de medo.

A mídia tradicional começou a falar em "apagão da Dilma", "apagão no governo Dilma". As primeiras vozes oposicionistas e oportunistas começaram a se levantar... Horas depois do problema e no momento em que a presidenta não aceita constrangimentos e ameaças e começa a colocar técnicos no comando de várias empresas do setor elétrico, há séculos dominadas por políticos.

Algumas manchetes nos portais jornalísticos do dia:

"Apagão atinge Nordeste do Brasil" (Jornal do Brasil)

"Apagão atinge várias capitais do Nordeste" (O Dia)

"Apagão no Nordeste deixa moradores sem água" (R7/Record)

"Apagão afeta 8 estados do Nordeste" (Rede TV!)

"Apagão afeta abastecimento de água e agências da Caixa em PE" (iG)

"Apagão atinge parte do Nordeste" (G1)

"Apagão atinge 8 estados do Nordeste" (Globo/Bom Dia Brasil)

"Falhas no sistema elétrico estariam por trás do apagão do Nordeste" (Band)

"Presidiário morre em Pernambuco em meio a tumulto durante apagão" (Estadão)

"Oposição culpa falta de qualificação por apagão no Nordeste" (Terra)

"Dilma soube do apagão de madrugada" (Estadão)

"Dilma ficou sabendo do apagão pela internet" (iG)

"Apagão: Nordeste às cegas" (O Globo)

"Dilma cobra providências sobre apagão do Nordeste" (O Globo)



Apagão Nordeste


No Tuiter, a hashtag #apagão figurou nos "trending topics"...

Nas primeiras horas da manhã, uma presidenta preocupada pediu explicações e providências ao ministro Lobão.

Ministro fez pronunciamento e deu entrevista.

Porta-voz da presidenta veio a público dar explicações.

Posts no Blog do Planalto...

Cadê a Blogosfera, perguntamos aqui, diante da ausência do assunto nos blogs ditos jornalísticos.

Os blogueiros continuaram tratando da Revolução no Egito, WikiLeaks, Lula, Battisti, regulação da mídia, PSDB, FHC...

No sábado, um blog de ativismo e variedades publicou um post falando mais do "apagão verdadeiro", o  tucano, em 2001.

Hoje o ministro das Minas e Energia se reune no Rio com várias autoridades ligadas ao setor elétrico para definir as causas do problema. Deve haver pronunciamento oficial.

Uma das linhas editoriais do Abra a Boca, Cidadão! é "Comunicação, Mídia e Poder". Vamos acompanhar o assunto na mídia. Não nos interessa, claro, a questão técnica. Mas o desdobramento do fato na mídia, nos meios políticos, na oposição, eventuais manipulações, buscando um desgaste no governo e na imagem da presidenta etc. etc.