Tem coisa que simplesmente não dá pra engolir. O "Nefasto", por exemplo.
Assino embaixo o artigo do Rui Martins.
O acordo LULA-Maluf
Rui Martins - Berna
Berna (Suíça) - Embora eu tenha operado as amígdalas e, recentemente, tenham me tirado a vesícula biliar, há uma coisa que não consigo fazer – é engolir sapo. E talvez, por isso, termine os poucos anos que me restam de militância como apartidário.
Ainda na semana passada, quando o ministro do Trabalho, neto do velho combatente Brizola, passava por Genebra, na Organização Internacional do Trabalho, um amigo tinha organizado uma feijoada com os companheiros do PT e me convidou não só para participar do encontro, como para aderir ao partido.
E eu, com aquela sinceridade e maneira direta capaz de chocar algumas pessoas, agradeci mas declinei da oferta: “meu caro, desde o dia em que deixei a igreja, prometi a mim mesmo, nunca mais pertencer a igreja ou partido. Nem acreditar em deus, seja qual for, e muito menos em líderes humanos, mesmo porque, no fundo sou um rebelde e nunca aceitaria ter de aceitar uma decisão com a qual não concorde”.
Faz dez anos, perdi meu emprego como correspondente europeu da CBN por ter insistido em malhar o ex-governador na época da ditadura e ex-prefeito Paulo Maluf, naquela questão das contas bancárias suíças. Escrevi mesmo um livro sobre esse caso, contando a sucessão de meus boletins a Heródoto Barbeiro, dando número do processo penal na Polícia Federal suíça, por suspeita de desvio de dinheiro público depositado em diversas contas sob nomes diferentes.
Nesse livro (“Dinheiro Sujo da Corrupção”, Geração Editorial), havia uma frase profética, um dom do qual não consegui me livrar: “Mas pode também não acontecer nada com Paulo Maluf e sua família – bastará para isso que os processos instaurados no Brasil terminem sem condenação ou sejam derrubados por falhas ou vícios processuais ao chegarem ao Supremo Tribunal Federal”.
Realmente, as contas de Maluf bloqueadas na Suíça logo serão desbloqueadas, pois até hoje não houve condenação brasileira e nem haverá. E a família Maluf receberá de volta com juros todos os milhões que, há alguns anos, provocavam tantas denúncias na mídia e revolta na população.
Entretanto, jamais poderia imaginar que no ano da criação da Comissão da Verdade, aconteça igualmente uma reabilitação política de Paulo Maluf de maneira clara e escandalosa como a ocorrida, sendo oficiante o ex-presidente Lula, a quem tenho apoiado, para tentar dar corpo à candidatura de Fernando Haddad à prefeitura de São Paulo.
Lembro-me do valoroso herói bíblico, Sansão, que perdeu todas suas forças ao lhe cortarem os cabelos. Será que Lula sem barba é outro Lula, diferente daquele que vi pessoalmente no Itamaraty, no encontro dos emigrantes, ou daquele diante do qual se puseram de pé, acho que há três anos, os representantes dos países membros da OIT no grande auditório do Palácio das Nações?
Por que jogar numa aventura paulistana, fadada à derrota, seu prestígio, ao aceitar um acordo eleitoral com Paulo Maluf ? Não posso ser político porque não engulo sapo, não posso ser diplomata porque não sei mascarar meus sentimentos. Falo como jornalista e como cidadão, para externar minha decepção. Por que trazer um desconhecido dos paulistanos, quando Erundina, ex-prefeita, teria muito mais chances e não seria necessária uma aliança com Maluf?
E, folheando meu livro, já esgotado, achei um episódio precedente - "a frase "indiciado não é culpado", de Ruy Falcão (na época porta-voz da ex-prefeita paulistana Marta Suplicy, hoje dirigente do PT), justificando o apoio malufista, nada tinha de escandalosa... ela se integrava na antologia oportunista da política brasileira... ". Maluf já havia recebido o apoio do PT, no segundo turno da candidatura de Marta Suplicy.
Escrevo este comentário para tornar pública minha decepção e que é, sem dúvida, de outros tantos paulistas e brasileiros, diante dessa coligação desnecessária. Não voto em São Paulo, ainda bem, porque não aceitaria participar dessa farsa.
Desculpe-me companheiro Lula, continuo admirando sua gestão como presidente, mas ninguém é perfeito, mesmo os grandes líderes erram, felizmente podemos divergir.
Parabéns Erundina por não ter aceitado participar dessa aliança.
Direto da Redação
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