CORRUPÇÃO INSTITUCIONAL
Não é dos astros a culpa
Sergio Fernando Moro*
A corrupção não é monopólio de agremiações políticas ou de governos específicos, e combatê-la deve ser bandeira da esquerda e da direita
Em 17 de fevereiro de 1992, foi preso, na Itália, Mario Chiesa, diretor de instituição filantrópica e pública de Milão, dando início à Operação Mãos Limpas ("Mani Pulite").
Após um mês, ele resolveu colaborar, alegando como álibi o famoso "tutti rubiamo così", ou "todos roubamos assim".
Dois anos depois, 2.993 mandados de prisão haviam sido expedidos e 6.059 pessoas estavam sob investigação, entre elas políticos e agentes públicos.
A Itália estava mergulhada na corrupção, forjando o termo "Tangentopoli" - ou seja, "cidade da propina", embora fosse mais apropriado "país da propina".
Como resultado, houve grande alteração do panorama político, propiciando um novo começo democrático, com méritos e deméritos.
Há, infelizmente, semelhanças com o quadro atual brasileiro - e não apenas o de hoje.
A corrupção não tem cores partidárias. Não é monopólio de agremiações políticas ou de governos específicos. Combatê-la deve ser bandeira da esquerda e da direita. Embora existam políticos corruptos em qualquer agremiação, não há partido que defenda a corrupção.
Há a responsabilidade das leis, do Executivo e do Judiciário. Das primeiras, pela estruturação de processo penal por vezes infindável, com múltiplos recursos que impedem que ações penais cheguem ao fim. Do segundo, por se tornar refém da política partidária e não adotar postura firme contra a deterioração da vida pública. Do terceiro, pela excessiva leniência, com louváveis exceções, em relação a esse tipo de criminalidade.
É necessário alterar a situação. É preciso legislação penal que, garantidos os direitos do acusado, permita que os processos cheguem ao final. Do Poder Executivo, menos fechar de olhos.
Imprescindível também mudança de percepção dos juízes quanto aos males da corrupção. Se um terço do rigor contra os criminosos do tráfico de drogas fosse transferido para os processos de crimes de corrupção, haveria grande diferença. Em parte, o problema não é a lei, mas de percepção dos juízes.
Defendo, em concreto, que o rigor se imponha em casos de crimes graves de corrupção. Especificamente, presentes evidências claras de crimes de corrupção, não se deve permitir o apelo em liberdade do condenado, salvo se o produto do crime tiver sido integralmente recuperado. Não é antecipação da pena, mas reflexão razoável de que, se o condenado mantém escondida fortuna amealhada com o malfeito, o risco de fuga ou de nova ocultação do produto do crime é claro e atual.
É fácil apresentar projeto de lei a respeito e igualmente viável defender, mesmo sem lei, posição jurisprudencial nesse sentido. Gostaria de ver isso defendido pelos candidatos à Presidência da República ou, mesmo antes, no Congresso Nacional e nos tribunais.
Enfim, a corrupção não é um dado da natureza ou consequência dos trópicos, mas um produto de fraqueza institucional e cultural. Como Brutus bem sabe, não é dos astros a culpa.
* SERGIO FERNANDO MORO, 42, é juiz federal e professor na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Destaques do ABC!
*
Nenhum comentário:
Postar um comentário