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segunda-feira, 23 de julho de 2012

A midiática Eliana Calmon e as "maçãs podres" do Judiciário

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A intrépida ministra Eliana Calmon,  Corregedora Nacional de Justiça, além de aprofundar e ampliar a fiscalização do mais fechado dos poderes da República, tem o mérito de ter denunciado os "Bandidos de Toga" e levado as entranhas do Judiciário para a mídia, expondo-as à luz do sol, o "melhor detergente", como se diz.



"Corruptos temem a mídia", declarou a ministra, e a cobertura do Judiciário pela grande imprensa e pelas redes sociais inevitavelmente contribui para a democratização e moralização de setores deste poder, inibindo a ação das "maçãs podres" aí existentes, e aproximando todo este aparato do cidadão comum, a quem o Judiciário evidentemente deve servir.


Abaixo os pontos principais de uma palestra do jornalista Frederico Vasconcelos, repórter especial da Folha de S. Paulo, que fala da importância social do jornalismo investigativo na cobertura cada vez mais intensa e aprofundada do Poder Judiciário, suas virtudes e mazelas, e a fundamental contribuição do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e da destemida ministra Eliana Calmon em sua inesquecível passagem pelo órgão.



A imprensa e a transparência no Judiciário

Frederico Vasconcelos




O texto a seguir é um resumo da exposição feita pelo editor deste Blog [Interesse Público/Blog do Fred] na sexta-feira (13/7) sobre o tema “Transparência no Judiciário“, durante o 7º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, evento organizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), na Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo.

O painel contou com a participação do presidente da Associação Juízes para a Democracia (AJD), José Henrique Torres, e foi moderado pelo jornalista Fabiano Angélico.

Eis as principais observações deste repórter:

1) A imprensa finalmente começou a cobrir o Poder Judiciário por dentro, como instituição, com seus erros e acertos.

2) A mídia não cobria o Poder Judiciário como faz em relação aos Poderes Executivo e Legislativo. Há muita informação de circulação interna no Judiciário. Há muitas distorções e pouca vigilância da mídia. Igualmente, há muitas histórias humanas exemplares no Judiciário que não chegam ao conhecimento do público.

3) Apesar de a mídia ter melhorado e ampliado a cobertura sobre o Judiciário, a maior exposição deste poder não resultou de pressão da imprensa ou da especialização de seus jornalistas – embora os dois movimentos tenham sido simultâneos. Essa abertura se deve, principalmente, ao próprio Judiciário. Foi um processo que ocorreu de dentro para fora.

4) Sem dúvida, a abertura foi estimulada pela cobrança da sociedade, que expressa, cada vez mais, através da imprensa e das redes sociais, sua insatisfação com a morosidade e a impunidade.

5) A transparência do Judiciário passou a ser uma exigência do Conselho Nacional de Justiça, que emitiu resoluções a respeito, determinando, por exemplo, a publicidade das informações sobre orçamentos, vencimentos, uso de veículo etc.

6) A ação penal do mensalão concentra a expectativa da sociedade por maior transparência no Judiciário. Foi relevante, lá atrás, a decisão do ministro Joaquim Barbosa de quebrar o sigilo do processo do mensalão. A transmissão pública das sessões de recebimento da denúncia pelo Supremo abriu uma janela para ajudar o cidadão comum a entender o ritual do Judiciário. A imprensa passou a acompanhar um grande caso, passo a passo, com a consulta periódica do andamento do processo. À parte as avaliações políticas sobre o mensalão, o processo tem sido um excelente laboratório para a imprensa. A cobertura do julgamento será um teste para a mídia.

7) Nos últimos anos, o noticiário sobre os fatos do Judiciário ficou ao sabor de diferentes geradores de informação. Durante o governo tucano, a imprensa dependeu muito do Ministério Público Federal como sua principal fonte.

8) Com o governo Lula, o Ministério Público deixaria de ser a fonte principal do noticiário sobre os fatos envolvendo o Judiciário. Seja porque houve acomodação do MPF, seja por uma estratégia de marketing político da Polícia Federal, a verdade é que a PF substituiu o MPF como maior gerador de fatos de interesse da mídia.

9) Era o período das grandes operações policiais, batizadas com nomes curiosos, realizadas com grande aparato e cobertura da mídia, muitas vezes previamente informada sobre local e hora das diligências de busca e apreensão. Em benefício dos defensores desse estilo de atuação da PF, diga-se que as operações só existiram porque foram autorizadas por magistrados; registre-se também que, apesar do aparato, não se tem notícia de vítimas de balas perdidas nessas operações.

10) A sucessiva exposição de personagens influentes, algemados ou não; a grita causada pelo aparato no cumprimento de mandados de busca em gabinetes de magistrados; o fato alegado de que as peças de acusação chegavam à imprensa sem que os defensores tivessem conhecimento das acusações, tudo isso gerou terreno fértil para fortalecer o movimento contra a chamada “pirotecnia” das operações da Polícia Federal. Isso tudo culminou com um manifesto assinado por doze famosos criminalistas cobrando limites à atuação da PF. Com a predominância de um discurso garantista, de valorização do direito à ampla defesa, as limitações ao uso de algemas etc., a Polícia Federal, depois dos episódios da Operação Satiagraha e da mudança em seu comando, perderia a condição de grande geradora de fatos de interesse para a imprensa.

11) O papel de principal interlocutor seria assumido pelo Poder Judiciário, com a atuação do Conselho Nacional de Justiça. O CNJ criou, no STF, uma agência de notícias que hoje abastece a imprensa em todo o país (1,5 milhão de acessos mensais ao site do CNJ na internet e 120 mil seguidores do órgão no Twitter).

12) É difícil imaginar que a imprensa investigativa, por conta própria, conseguiria trazer à luz os muitos casos de corrupção e as distorções identificadas pelas inspeções do CNJ nos tribunais estaduais. Tenho dúvidas se o jornalismo policial, também por seus próprios meios, conseguiria documentar as condições indignas dos presídios, com a mesma amplitude e imagens obtidas nos mutirões carcerários.

13) O CNJ assumiu o papel de principal revelador das mazelas do Judiciário, através da corregedoria nacional de Justiça. Era previsível que essa exposição das “maçãs podres” do Judiciário gerasse a série de embates internos, que aflorassem resistências, recrudescendo o corporativismo na magistratura.

14) No primeiro momento, essas reações foram dirigidas às audiências públicas nos Estados, na época do então corregedor Gilson Dipp, sob o argumento de que deixavam vulneráveis os magistrados submetidos à execração pública. No segundo momento, esse choque ganhou proporções inéditas com as várias tentativas de esvaziar os poderes da sucessora de Dipp, ministra Eliana Calmon.

15) A corregedora, então isolada no CNJ, soube trazer os fatos ao conhecimento da sociedade, por meio da imprensa. Conseguiu reverter uma situação que tornava insustentável sua atuação no Conselho.

16) Iniciaremos, em breve, outro ciclo, com a posse do novo corregedor nacional de Justiça, ministro Francisco Falcão. O grande diferencial na cobertura do Judiciário pela mídia, no entanto, poderá ser o estilo que o futuro presidente do STF e do CNJ, ministro Joaquim Barbosa, imprimirá no comando dos dois órgãos em sua gestão.

17) A maior ou menor transparência do Judiciário independe da especialização dos jornalistas, pois tem mais a ver como cada administração lida com a opinião pública. Há um obstáculo permanente: a cada dois anos, mudam os dirigentes nos tribunais, cuja área de comunicação fica sujeita à vontade e disposição dos administradores de prestar contas à sociedade.

18) Minha expectativa é que a imprensa aprofunde, cada vez mais, o conhecimento sobre como as decisões administrativas são tomadas nos tribunais; que conheça os regimentos internos de cada Corte para melhor questionar as diferenças e identificar distorções; que se interesse em fazer reportagens sobre as condições de trabalho dos servidores e juízes, principalmente nas varas e comarcas do interior; que a cobertura não se resuma a ecoar e repercutir as decisões das cortes superiores; que conheça bem o perfil dos dirigentes das Cortes e que exerça seu papel legítimo de cobrança junto às corregedorias.

19) Enfim, que trabalhe na cobertura do Judiciário com o mesmo desembaraço e persistência como faz em relação ao Legislativo e ao Executivo.

20) Ao ingressar na blogosfera, com a criação do Blog “Interesse Público”, em 2007, surpreendi-me com a descoberta de muitos blogs mantidos por magistrados. Ao contrário da imagem de que “juízes só se manifestam nos autos” ou por meio de suas entidades, percebi que muitos magistrados têm interesse em expor suas opiniões, registrar suas discordâncias sobre fatos relevantes do Judiciário e dos outros Poderes. Acho que a sociedade terá muito a ganhar se os jornalistas ampliarem o leque de fontes nessa área, seja para sopesar avaliações, seja para enriquecer o debate com opiniões de novos interlocutores.



Blog do Fred


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