Carta Aberta ao Dr. Marcos Coelho, Presidente da OAB
Um juiz aposentado escreve ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil e levanta questões interessantes sobre como meios de comunicação tentam intimidar, emparedar e até ameaçar juízes do STF. "E ameaçar o mais velho Juiz da República, no gozo de seu mandato de Ministro da Suprema corte de um país? Não será crime? Publicar uma ameaça em jornal, no rádio, na TV ou numa revista terá o condão de transformar o criminoso que ameaça um juiz, se for punido por isso pela justiça, em vítima da falta de liberdade de imprensa?", indaga o magistrado
Ilustríssimo Senhor Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil,
Dr. Marcos Vinicius Furtado Coelho
A simples existência de um Poder Judiciário é uma dádiva da Sociedade Humana.
Civilizações de há pouquíssimos anos podem ter possuído juízes, talvez. Mas não um Poder Judiciário. Essa conquista, genuinamente Republicana, deve ser muito cara e preservada em sua isenção.
O Judiciário brasileiro é caro, é lento, está atulhado de milhões de processos, por falta de infraestrutura, de pessoal.
Mas é nosso Judiciário. É um bem de todos. É pago por todos nós e deve funcionar bem. E tem melhorado muito mercê a atuação de VS, de outros presidentes da OAB e, principalmente, depois da criação do Conselho Nacional de Justiça.
O Judiciário é a última garantia da sociedade contra os poderosos que não sabem usar seu poder. E contra os desonestos, que não respeitam a propriedade alheia e, muito menos, a propriedade pública.
O nosso Judiciário é a nossa garantia contra os violentos que não respeitam a integridade física dos demais. Contra os imorais, que não respeitam o pudor nem a inocência.
O Judiciário, por pior que seja, é em todo o mundo a única garantia aceitável, além da força física do caluniado, contra os caluniadores, que são aqueles que não respeitam a integridade moral da pessoa humana, que acusam sem provas, que falam mal por falar mal.
Ou ainda por terem feito da calúnia seu meio de vida, seu ganha-pão, sua profissão ou, ainda, por obscuros motivos de patológica satisfação pessoal devidas a traumas de toda sorte.
O crime de ameaças também é punido pelo Judiciário.
E em todo o mundo. Ele consta há muito tempo de nosso ordenamento jurídico.
Ameaçar qualquer pessoa no Brasil é crime previsto com penas severas de detenção.
E ameaçar um Juiz? Não será crime?
E ameaçar o mais velho Juiz da República, no gozo de seu mandato de Ministro da Suprema corte de um país? Não será crime?
E se, além de ameaçá-lo, o criminoso fizer isso de público, através da imprensa?
Publicar uma ameaça em jornal, no rádio, na TV ou numa revista terá o condão de transformar o criminoso que ameaça um juiz, se for punido por isso pela justiça, em vítima da falta de liberdade de imprensa?
E se o criminoso passasse a ameaçar o magistrado com a possibilidade de que, se sua decisão como juiz não for aquela a que ele, o criminoso, gostaria que fosse tomada, o criminoso ameaçasse instigar contra o juiz e contra a sua família, turbas violentas e mascaradas dizendo que elas o iriam enfrentar e abordar em plena rua?
Isso também não será crime? Não estará o ameaçador, além de ameaçando, querendo interferir indevidamente no processo judicial?
Será que só porque a ameaça foi feita através da imprensa, isso transforma a ameaça em justo “direito de expressão” e correto “uso da liberdade de imprensa”?
Estará previsto na Lei que a apresentação do diploma de jornalista, ou prova do exercício dessa profissão, dá ao acusado de ser ameaçador e de querer interferir irregularmente num processo imunidade perante a Lei para fazer suas ameaças sem ser alcançado pelo braço da Justiça?
Senhor Presidente: há vários meses temos assistido na imprensa, inertes e indiferentes, o exercício do crime de ameaças por parte de vários cidadãos contra os ministros do STF. A maioria dos que ameaçam os maiores julgadores do nosso Poder Judiciário trabalham para grupos econômicos da imprensa falada e escrita, todos com graves problemas policiais por crimes de sonegação, falsificação, espionagem, formação de quadrilha com banqueiros do bicho e criminosos de todas as espécies.
E aí?
Vamos ficar calados?
Ou será que, se o STF não reage a essas ameaças porque seu presidente também parece estar devendo vários favores aos mesmos grupos econômicos e por isso não faz nada, estaria na hora de nós, usuários do Judiciário, entrarmos na conversa e processarmos pelo crime de ameaças o indivíduo conhecido por Merval Pereira, entre outros?
E mais: será que impedir o livre curso do processo judicial, através de ameaças públicas à integridade da pessoa de um juiz, também não é um outro crime?
Será que permitir que uma empresa, no caso do ramo de comunicações, interfira através de seu poder de mercado, no Judiciário, não é motivo para cancelar a concessão pública que esta empresa exercite?
E se essa empresa tiver grandes problemas com o judiciário e a receita federal, tão graves a ponto de ter sido o processo judicial roubado do fórum público por funcionária comprometida de várias formas com esta empresa, isso não é também um motivo pelo qual ela queira poder interferir na suprema corte do Judiciário?
O poder judiciário brasileiro é patrimônio do povo brasileiro. A Ordem dos Advogados do Brasil também.
Senhor Presidente, aguardamos as ações de Vossa Senhoria no sentido de garantir a isenção do Judiciário do Brasil, através da intransigente defesa da integridade física e moral de seus membros frente às ameaças, várias, de dirigentes e empregados de alguns veículos de comunicação de massa.
Senão, qualquer dia desses, qualquer dono de qualquer jornaleco do interior estará ameaçando, velada ou abertamente, o juiz recém chegado para obter qualquer sentença que desejar, mesmo que completamente errada, dando-lhe poder para açambarcar áreas, matar, violar, roubar e perseguir os mais pobres. E isso não se pode permitir mais que aconteça, pois vai longe, Graças a Deus, este tempo no Brasil.
Isso não pode voltar a acontecer!
Muito menos “em nomi da liberdadi de imprença”.
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