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sábado, 15 de dezembro de 2012

Mídia brasileira: combate à corrupção ou "caça ao Lula"?


"Há algo de muito errado ou na presidenta Dilma ou na mídia brasileira quando, para dar uma entrevista relevante, ela opta por publicações estrangeiras, como foi o caso, agora, do Le Monde. (...)

Dilma parece ter que fugir da imprensa brasileira para se manifestar.

Ela disse duas coisas importantes sobre o tema da corrupção. A primeira é óbvia: este é um drama mundial, e não brasileiro. Basta ver os levantamentos de institutos como a Transparência Internacional. (Nos últimos dez anos, aliás, a posição do Brasil na lista da TI melhorou.)

A segunda, embora óbvia também, foi parcialmente elíptica. Combater a corrupção não deve se confundir com 'caça às bruxas'.

Mais correto teria sido dizer 'caça a Lula'. (...)


Dilma fez bem em dizer isso. Foi um gesto parecido com o olhar glacial que ela endereçou a um sorridente Joaquim Barbosa no enterro de Niemeyer. É como se ela estivesse dizendo à mídia brasileira: 'Vamos deixar de hipocrisia e farisaísmo. Quem é bonzinho mesmo aí? A família Marinho? Ah, bom saber.' "





A entrevista de Dilma ao Le Monde

PAULO NOGUEIRA

Dilma parece ter descoberto que só vai conseguir mesmo ser ouvida direito na mídia internacional



Dilma com o presidente francês Hollande, em Paris


Há algo de muito errado ou na presidenta Dilma ou na mídia brasileira quando, para dar uma entrevista relevante, ela opta por publicações estrangeiras, como foi o caso, agora, do Le Monde.

Faça sua escolha.

Imaginemos que Dilma considerasse a mídia brasileira para falar o que pensa sobre a questão da corrupção e do cerco a Lula.

A qual publicação ela poderia dar uma entrevista sem que se sentisse num terreno francamente hostil? Ao Globo de Merval? À Veja de Reinaldo Azevedo? À Folha de Otavinho? Ao Estadão de Dora Kramer?

A Petrobras teve que fugir da justiça brasileira e recorrer à justiça americana para processar Paulo Francis por calúnias, num caso célebre.

Dilma parece ter que fugir da imprensa brasileira para se manifestar.

Ela disse duas coisas importantes sobre o tema da corrupção. A primeira é óbvia: este é um drama mundial, e não brasileiro. Basta ver os levantamentos de institutos como a Transparência Internacional. (Nos últimos dez anos, aliás, a posição do Brasil na lista da TI melhorou.)

A segunda, embora óbvia também, foi parcialmente elíptica. Combater a corrupção não deve se confundir com “caça às bruxas”.

Mais correto teria sido dizer “caça a Lula”.

Se você se deixa levar pelo noticiário da grande imprensa, Lula não apenas percorreu todos os degraus possíveis da escada da corrupção como está indiretamente ligado a um assassinato.

É um “mar de lama”, para usar a expressão com que o arquiconservador Carlos Lacerda martelou o governo de Getúlio Vargas.

Vargas criou o voto secreto, que impediu que industriais e fazendeiros vigiassem se seus empregados votavam em quem eles queriam. Trouxe também uma legislação trabalhista que deu direitos inéditos a trabalhadores que se esfolavam de segunda a segunda, sem férias.

Os industriais de então opuseram todo tipo de resistência aos direitos outorgados por Vargas. Vargas estava aperfeiçoando o capitalismo, assim como Ted Roosevelt fizera nos Estados Unidos duas décadas antes. Mas para os industriais brasileiros ele estava “assassinando” o capitalismo.

De tudo isso, resultou o “mar de lama”, a expressão com a qual os grandes jornais desestabilizaram o governo de Vargas até levá-lo ao suicídio, em 1954. O “mar de lama” de Lacerda era tudo – menos uma vontade genuína de extirpar a corrupção.

O patriotismo pode ser o último refúgio do canalha, como ensinou o escritor inglês Samuel Johnson. Também o “combate à corrupção”, aspas, pode ter uso sinistro, como o feito por Lacerda com seu “mar de lama”.

Vargas ainda tentou mitigar o cerco da grande imprensa da época criando condições para que surgisse um jornal com uma visão menos arcaica e menos vinculada aos interesses dos ricos, a Última Hora, de Samuel Wainer. (Wainer seria atacado por Lacerda até pelo fato de ser judeu.)

Mas não foi bastante.

A história parece estar se repetindo. Assim como houve uma caça não à corrupção mas a Getúlio Vargas, agora o que se tem é uma caça não à corrupção, e nem às bruxas, mas a Lula.

Dilma fez bem em dizer isso. Foi um gesto parecido com o olhar glacial que ela endereçou a um sorridente Joaquim Barbosa no enterro de Niemeyer. É como se ela estivesse dizendo à mídia brasileira: “Vamos deixar de hipocrisia e farisaísmo. Quem é bonzinho mesmo aí? A família Marinho? Ah, bom saber.”

Os mais otimistas podem acreditar que por trás da campanha está um propósito de moralização. Quem é menos romântico sabe que o que no fundo se deseja é o retorno a tempos em que o BNDES funcionava como pronto-socorro de empresas quebradas, à custa do contribuinte, e em que Roberto Marinho designava ministros das Comunicações depois de receber uma concessão de tevê e financiamentos estatais a juros de mãe.

Não era o capitalismo de Adam Smith, ou de David Ricardo. Era ação entre amigos. Capitalismo é risco e concorrência – e isso não havia.

As empresas brasileiras tinham reserva de mercado – algo que ainda existe, por incrível que pareça, para a mídia –, e quem pagava por essa mamata era a sociedade, obrigada a comprar produtos caros e ruins.

Os discípulos de Lacerda – nenhum com uma fração de seu talento, mas herdeiros da mesma dose colossal de maldade — continuam a se bater obstinadamente por um capitalismo que é a negação do capitalismo.

O verdadeiro capitalismo – aquele que é efetivamente sustentável – está na Escandinávia, nas admiráveis Dinamarcas, Finlândias e Noruegas da vida, terras libertárias, transparentes, pujantes, empreendedoras, competitivas, e onde ninguém é melhor que ninguém por causa da conta do banco.


Diário do Centro do Mundo

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O Be-a-bá do Golpe


“Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.”

(Eduardo Alves da Costa, No caminho, com Maiakóvski)

No terceiro milênio, na Era de Aquário, em plena sociedade planetária, digital,  a "sociedade do espetáculo", instalados em confortáveis poltronas, assistimos ao golpe estampado nas telas de alta definição das tevês, pela internet, em tempo real, ao vivo e em cores.





O Manual do Golpe de Estado



(HD) - Cúrzio Malaparte escreveu, em 1931, seu livro político mais importante, Técnica del colpo di Stato: envenenamento da opinião pública, organização de quadros, atos de provocação, terrorismo e intimidação, e, por fim, a conquista do poder. Malaparte escreveu sua obra quando os Estados Unidos ainda não haviam aprimorado os seus serviços especiais, como o FBI - fundado sete anos antes - nem criado a CIA, em 1947. De lá para cá, as coisas mudaram, e muito. Já há, no Brasil, elementos para a redação de um atualizado Manual do Golpe.

Quando o golpe parte de quem ocupa o governo, o rito é diferente de quando o golpe se desfecha contra o governo. Nos dois casos, a ação liberticida é sempre justificada como legítima defesa: contra um governo arbitrário (ou corrupto, como é mais frequente), ou do governo contra os inimigos da pátria. Em nosso caso, e de nossos vizinhos, todos os golpes contra o governo associaram as denúncias de ligações externas (com os países comunistas) às de corrupção interna.

Desde a destituição de Getúlio, em 29 de outubro de 1945, todos os golpes, no Brasil, foram orientados pelos norte-americanos, e contaram com a participação ativa de grandes jornais e emissoras de rádio. A partir da renúncia de Jânio, em 1961, a televisão passou também a ser usada. Para desfechá-los, sempre se valeram das forças armadas.

Foi assim quando Vargas já havia convocado as eleições de 2 de dezembro de 1945 para uma assembléia nacional constituinte e a sua própria sucessão. Vargas, como se sabe, apoiou a candidatura do marechal Dutra, do PSD, contra Eduardo Gomes, da UDN. Mesmo deposto, Vargas foi o maior vitorioso daquele pleito.

Em 1954, eleito pelo povo, Vargas venceu-os, ao matar-se. Não obstante isso, uma vez eleito Juscelino, eles voltaram à carga, a fim de lhe impedir a posse. A posição de uma parte ponderável das Forças Armadas, sob o comando do general Lott, liquidou-os com o contragolpe fulminante. Em 1964, contra Jango, foram vitoriosos.

A penetração das ONGs no Norte do Brasil, e a campanha de coleta de assinaturas entre a população dos 7 Grandes - orientada, também, pelo Departamento de Estado, que financiava muitas delas – para que a Amazônia fosse internacionalizada, reacenderam os brios nacionalistas das Forças Armadas. Assim, os norte-americanos decidiram não mais fomentar os golpes de estado cooptando os militares, porque eles passaram a ser inconfiáveis para eles, e não só no Brasil.

Washington optou hoje pelos golpes brancos, com apoio no Parlamento e no Poder Judiciário, como ocorreu em Honduras e no Paraguai. Articula-se a mesma técnica no Brasil. Nesse processo, a crise institucional que fomentam, entre o Supremo e o Congresso, poderá servir a seu objetivo – se os democratas dos Três Poderes se omitirem e os patriotas capitularem.


Mauro Santayana

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