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segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Bláblárina ganha Prêmio "Conversa Pra Boi Dormir"


"PERDER-SE TAMBÉM É CAMINHO" (Clarice Lispector)



Sempre admirei muito a ex-ministra do Meio Ambiente e senadora Marina Silva, por sua história de vida e sua luta como ambientalista, reconhecida no mundo todo. Mas infelizmente o exacerbado sentimento de vingança conduziu a ex-ministra a um caminho sem volta, fazendo-a aliada do que há de mais obtuso e sinistro na política brasileira.


Foto: Max Haack/BN/Google


A “heteroestima” de Marina Silva e o Prêmio Conversa Para Boi Dormir


Kiko Nogueira*

Ela

O Prêmio Doublespeak foi inventado em 1974 pelo Conselho Nacional de Professores de Inglês dos Estados Unidos. Como a entidade define, trata-se de uma “homenagem irônica a oradores públicos que perpetuaram uma linguagem grosseiramente enganosa, evasiva, eufemística, confusa ou autocentrada”.

Nesses 40 anos, a lista de premiados incluiu Bushs pai e filho, Bill Clinton, o Departamento de Estado americano, Ronald Reagan, a indústria do tabaco, a Exxon e a Associação Nacional do Rifle. A CIA foi agraciada com a honraria por anunciar que não iria mais usar o termo “matar” em seus relatórios. Em seu lugar, entraria a expressão “privação ilegal ou arbitrária da vida”. Em 2013, quem ganhou foi o prefeito de Chicago, Rahm Emanuel.

É preciso criar algo parecido aqui. O Prêmio CPBD, Conversa Para Boi Dormir. O primeiro vencedor é relativamente batata. Marina Silva. Pelo conjunto da obra e, especialmente, por seu último artigo na Folha. É um texto que cabe na definição de George Orwell num ensaio: feito para dar “aparência de solidez a vento puro”.

Vamos a alguns trechos da coluna que mereceu o Prêmio CPBD:

Em meio aos abraços amigos e desejos de feliz Ano-Novo, costumamos reconhecer a sinceridade dos desejos para além das palavras, pois estas são, muitas vezes, gastas e repetidas. As palavras necessitam de gestos que recuperem e sustentem seu sentido.

Releio Hannah Arendt, para melhor refletir sobre a possibilidade de restaurar a capacidade humana de lidar com as desconfianças e incertezas causadas pela ameaça do imprevisível, por meio do milagre da “promessa”. Na dimensão política da crise civilizatória que vivemos, a crise de confiança é o centro do problema.

Ainda é possível refazer a confiança, dentro de um espaço de heteroestima política, social, cultural, como indivíduos e como povo? Temos motivo para descrer, num mundo fragmentado em que as relações se liquefazem e escorrem, sem estabilidade. Mesmo as novas formas de relacionamento e comunicação que inventamos, muitas vezes parecem ser uma desesperada tentativa de agarrarmo-nos uns aos outros, multiplicando conexões frágeis e superficiais na ausência de laços de confiança efetivos e afetivos.


É um clássico da “linguagem evasiva e autocentrada”. No meio do blablablá, surge uma palavra chave: heteroestima. Não está no dicionário. Consta que é o oposto de autoestima, segundo Fátima Bernardes e Ana Maria Braga.

Podemos, sim, superar a fragmentação do mundo em crise compondo novas sínteses baseadas em novas harmonias. Se já não confiamos naqueles que prometeram tudo, eis aí o sinal para que nossa nova promessa seja um acordo, simples e claro, naquilo que é essencial. A confiança vem do que é sustentável.

Esse último parágrafo foi colocado no Google Tradutor, mas o aplicativo não reconheceu o idioma. É possível que Marina fale a língua dos seus eleitores. Mas, ainda assim, é duvidoso que eles entendam tudo. Hannah Arendt, que ela afirma ter relido, disse o seguinte: “O problema de mentir e enganar é que sua eficiência depende inteiramente de uma noção clara da verdade que o mentiroso e enganador deseja esconder”.

* Diretor-adjunto do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

Diário do Centro do Mundo

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Barbosa e o populismo midiático e golpista


OPINIÃO


Joaquim Barbosa e a demagogia golpista judicial

Miguel do Rosário


Cláudio Couto, em artigo para o Valor, nos traz um argumento fatal para mostrar como é absurda a “regalia” dada a juízes, que lhes permite se filiar a um partido e ser candidato a cargo político apenas seis meses antes das eleições. Cidadãos comuns têm prazo mínimo de um ano para fazê-lo.

Couto argumenta que, por serem juízes, deveriam ter um prazo maior, uma quarentena, para que não houvesse contaminação eleitoral nas suas decisões judiciais. E para evitar um populismo profundamente perigoso, porque fundamentado num judiciário politizado e tendencioso, que visa não a justiça, mas o poder.

Eu acrescentaria ainda que Joaquim Barbosa, em seu populismo midiático e golpista, vem atraindo todos os psicopatas pró-golpe militar, como se pode verificar rapidamente monitorando seu nome no Twitter:

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Outra coisa: mesmo assim, eu prefiro muito mais Joaquim Barbosa candidato e político do que como ministro do Supremo. Como candidato, ele está na superfície, podendo e devendo receber críticas de advogados, juristas, políticos. Como ministro, ele ocupa um cargo de poder que intimida seus críticos. Só mesmo os blogueiros, e alguns juristas mais corajosos (mas raros), é que têm coragem de criticá-lo.

Leia o artigo de Couto:

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Barbosa e o populismo

Cláudio Gonçalves Couto

A legislação eleitoral e partidária brasileira contém uma curiosa exceção relativa ao prazo de desincompatibilização e, particularmente, de filiação partidária para aqueles que desejam concorrer nas eleições. Juízes, promotores, membros de tribunais de contas e militares dispõem de um prazo mais generoso do que os cidadãos comuns. Enquanto estes últimos devem se filiar a um partido político a pelo menos um ano da eleição que pretendem disputar, os primeiros podem fazê-lo a apenas seis meses do pleito.

O curioso de tal regra é que ela gera uma inversão, pois é justamente dos primeiros, tendo em vista as funções públicas que exercem, que se deveria exigir um prazo maior para a desincompatibilização e a filiação partidária – ou seja, uma quarentena. Afinal, juízes podem condenar ou absolver com vistas à aprovação pública; promotores podem acusar com o mesmo fito; membros de tribunais de contas podem criar constrangimentos sérios para adversários políticos, rejeitando contas e interrompendo políticas; militares (sobretudo policiais) podem se valer do uso autorizado da violência para agradar ao público. Em todos esses casos, a possibilidade de uma atuação eleitoralmente rentável em período próximo ao pleito é um estímulo a excessos e exorbitâncias.

É justamente tal regra que possibilitou a recente filiação ao PSB da ex-corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Eliana Calmon, às vésperas do Natal. E é ela que permite tantas especulações acerca da possível candidatura presidencial de Joaquim Barbosa em 2014 – sabe-se lá por qual partido. Some-se a isto as pesquisas de intenção de voto, que indicam Barbosa em segundo lugar, à frente do tucano Aécio Neves e do socialista Eduardo Campos.


Populistas são os que atropelam as instituições dadas

Barbosa surge para uma boa parcela do eleitorado e mesmo da opinião pública como a figura do herói. As celebrizadas fotografias do magistrado trajando sua longa capa negra, tal qual um Batman, reforçam essa imagem do herói. Por um lado, o ícone do justiceiro decorre da tradicional inapetência da justiça brasileira para punir poderosos. Num tal cenário, a condição de relator do mensalão lhe caiu bem, ainda mais considerando-se sua formação de promotor, que conferiu à sua atuação de magistrado um feitio híbrido, de juiz-acusador. E como suas posições prevaleceram sobejamente no julgamento, Barbosa saiu-se dele não apenas como herói, mas como herói vitorioso.

Por fim, vieram as prisões dos condenados. Determinadas por ele, começaram seletivamente pelos petistas, foram significativamente realizadas no dia da República e produziram excessos, como a destinação ao regime fechado de condenados ao semiaberto e a condução a Brasília de réus domiciliados longe dali. Por um lado, este gran finale produziu um espetáculo com o qual se regozijaram muitos brasileiros sedentos de justiça (não só os antipetistas) e rendeu novos dividendos de popularidade ao juiz-acusador. Por outro, tornou mais explícita uma certa tendência a exceder os limites do que autoriza a lei – como observaram diversos juristas.

São estas características de Barbosa que parecem ter inspirado a resposta de Fernando Henrique Cardoso ao questionamento que lhe foi dirigido sobre a possibilidade da candidatura presidencial do magistrado. Disse ele que “As pessoas descreem tanto nas instituições que buscam heróis salvadores… Ele teria que ter um partido para começar, acho que ele é uma pessoa que tem sentido comum e duvido que vá fazer uma aventura desse tipo”. E ainda acrescentou: “É difícil imaginar Barbosa na vida partidária, ele não tem o traquejo, o treinamento para isso, uma coisa é ter uma carreira de juiz, outra coisa é ter a capacidade de liderar um país. Talvez o Senado, a vice-presidência. Não creio que ele tenha as características necessárias para conduzir o Brasil de maneira a não provocar grandes crises. Confio no bom senso dele”.

De uma tacada, o ex-presidente e notável sociólogo apontou a falta de treino político e de lastro institucional (partidário) de Joaquim Barbosa. Mais do que isto, notou que a figura do herói surge justamente no vácuo criado pelo descrédito nas instituições, mas se constitui numa aventura capaz de suscitar grandes crises. Ao que disse FHC, poder-se-ia acrescentar que uma eventual eleição de Barbosa seria a receita perfeita para que experimentássemos o populismo. E, ironicamente, a simpatia por sua candidatura provém justamente de setores raivosamente antipetistas que identificavam em Lula a figura do populista. Só que Lula, assim como FHC, está muito distante do populismo.

O populismo se caracteriza pelo exercício de uma liderança pessoal, normalmente de tipo carismático, que atropela as mediações institucionais na execução de seu projeto, fazendo apelos diretos ao povo na busca de legitimação. Lula está distante disto porque, embora seja um líder carismático, atua o tempo todo por meio das instituições. Seu pecado talvez seja outro: o de ser demasiadamente institucional. Não apenas porque dispõe de um lastro partidário muito forte, mas porque privilegiou a política de coalizões partidárias no Congresso, a negociação com os governadores, o diálogo com o judiciário etc.. Seu baixo ímpeto reformista em relação às instituições deve-se a isto: Lula mais buscou atuar por meio das instituições existentes do que reformá-las. Mesmo FHC foi mais ousado do que ele sob este aspecto, tendo apoiado a emenda da reeleição e reformado o Estado.

Comparando: Hugo Chávez sim era um populista. Destroçou o antigo sistema político venezuelano para fazer avançar seu próprio projeto, alicerçado no carisma, nas políticas sociais e no apelo direto ao povo.

Barbosa se enquadraria a um feitio similar. Oriundo de fora dos partidos estabelecidos e propenso a exceder os limites institucionais para fazer valer suas convicções, angariando apoio popular, é difícil imaginá-lo construindo coalizões e fazendo concessões a políticos tradicionais para lograr avanços parciais em seu projeto. O mais provável seria tentá-lo fazer na marra, como o fazem os heróis.

Cláudio Gonçalves Couto é cientista político, professor da FGV-SP e colunista convidado do “Valor”. Humberto Saccomandi volta a escrever em 29 de janeiro.

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O Cafezinho

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