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quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Estilo Dilma de ser e presidir

Blogar também é "garimpar"...

Antes de blogueira, sou sobretudo leitora de blogs, e aprecio navegar pela blogosfera e internet em geral pesquisando textos bem escritos e outros pontos de vista sobre os temas de mais interesse dos leitores, dentro das linhas editoriais do ABC!

O governo inédito da primeira mulher presidente da República do Brasil continua sendo o "assunto do momento" e rendendo muitos posts. Todos os olhares, câmeras, holofotes continuam voltados para o Planalto Central do Brasil.

E sobre o jeito discreto, formal, objetivo e eficiente de ser da presidenta Dilma, já manifesto nas primeiras semanas de governo e nas medidas implementadas, publico abaixo artigo do jornalista Jaime Sautchuk, que encontrei e li no blog O Terror do Nordeste. 




O estilo Dilma



A primeira reunião ministerial e as três primeiras semanas de governo já dão pistas de qual será o estilo de trabalho da presidente Dilma Rousseff. O básico é a cobrança de resultados práticos e unidade da equipe, com relações harmoniosas com o Congresso e com o Judiciário.


A reunião com os ministros, que poderia ser descontraída no sentido de estreitar os laços entre os membros do gabinete que ainda não se conhecem direito, foi diferente. Foi uma reunião de trabalho, com pauta bem definida e fixação de prioridades.


Pé no freio dos gastos públicos e critério técnico para a formação das equipes de segundo e terceiro escalões foram dois pontos centrais das intervenções da presidente. Isto, pelo que se depreende de informações soltadas aqui e acolá por participantes da primeira reunião.


Quanto às contratações, por exemplo, o que deve vigorar é a preocupação com a eficiência da máquina administrativa e com a ética pública. Entre parente, amigo, companheiro de política ou um técnico que conheça da área a ser tocada não deve haver dúvida: o escolhido deve ser o técnico.


Ninguém impôs ou sequer sugeriu, mas ficou implícito na reunião que está fora de cogitação qualquer comparação entre o atual governo e o do ex-presidente Lula. O fato de dar seguimento às políticas que vêm dos últimos oito anos não significa jeito igual nos procedimentos.


A solução de problemas de maior porte deve ter o concurso de todos que possam ajudar, com opiniões ou com ações. Este é o caso, desde logo, de dois "pepinos" que caíram nas mãos da presidente neste começo de governo. São o índice do salário mínimo e a tragédia do Rio de Janeiro.


Quanto ao salário mínimo, a opinião que prevalecia era a de que os R$ 540,00 previstos pelo governo estaria de bom tamanho. Mas, ainda assim, a questão foi reaberta, até por conta do receio de entrar em choque com o Congresso. Rever números, ainda que pouco, seria demonstração de boa vontade. E foi isso que ocorreu.


No caso do aguaceiro, destruição e mortandade na região serrana do Rio, a resposta veio com ações. Em menos de 48 horas, o governo federal já tinha se posicionado sobre o assunto, definido fontes de recursos para a emergência e a própria Dilma visitou a região abalada com ministros.


Além disso, ao se manifestar sobre o assunto, juntamente com o governador Sérgio Cabral, ela foi clara ao definir as responsabilidades numa situação como esta. O problema não é deste ou daquele nível da administração pública. É um problema do Brasil e o governo, em todas as esferas, deve se empenhar para reparar o que for possível repor.


A liberação imediata de R$ 780 milhões do Fundo de Emergência para os gastos necessários, da reposição de estradas e pontes ao socorro às vítimas com remédios, atendimento médico e abrigo, é apenas uma parte. O que se viu foi o gabinete inteiro mobilizado.


Vários ministérios agiram ao mesmo tempo, com rapidez e eficiência. Saúde, Cidades, Integração, todas as áreas se mobilizaram, apesar de ser início de governo. No caso da Defesa, o ministro Nelson Jobim colocou Exército, Marinha e Aeronáutica em ação desde as primeiras horas.


É certo que fica evidente certo despreparo do País para situações como esta que se enfrenta no Rio. Mesmo tendo, como no caso do Exército, tropas treinadas em situações práticas, como no atendimento à população do Haiti, vítima do terremoto do ano passado.


Também nisso, porém, a presidente foi direta e sincera com a nação ao afirmar que ainda são poucos os investimentos na prevenção desse tipo de catástrofe. Ela não falou, mas quem quiser entende, que ações relativas ao ordenamento urbano são, em primeiro lugar, das prefeituras municipais.


A prática de não interferir na ocupação de áreas de risco por gente que, no fim das contas, é eleitor é muito comum no Brasil. Mas, se é que se pode tirar algo de positivo de tamanha desgraça, fica o exemplo para os prefeitos. E, no âmbito federal, o poder da fiscalização da aplicação de recursos para este fim destinados.


E aí, voltamos ao tom das ações e recomendações deste início de governo. Os investimentos necessários, estejam ou não no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), terão que ser feitos. Daí, o rigor nos gastos públicos cobrado por Dilma. Dinheiro há, é só saber gastar.


A reparação dos estragos causados pelas chuvas de janeiro no Rio e em vários outros estados são gastos imprevistos, que apertam o caixa, mas têm que ser feitos. O que prevê o PAC para infra-estrutura, também. E aí são incluídas as obras, igualmente urgentes, de preparação do País para os eventos esportivos que vamos hospedar.


Esse cuidado Dilma tem tido no cotidiano de seu gabinete. Se conferirmos sua agenda, por exemplo, veremos que ela dedica a maior parte do seu tempo a assuntos internos. A interlocução com a sociedade tem sido feita, de maneira um tanto quanto silenciosa, pelo ministro-chefe da Casa Civil, Antônio Palocci.


Pelo que já se vê, pois, tudo indica que a eleição da presidente Dilma foi voto muito bem aplicado.

 
* Trabalhou nos principais órgãos da imprensa, Estado de SP, Globo, Folha de S. Paulo e Veja. E na imprensa de resistência, Opinião e Movimento. Atuou na BBC de Londres, dirigiu duas emissoras da RBS.






Tragédia climática: é preciso reconstruir o homem

Como blog pluralista, procuramos publicar sempre que possível vários pontos de vista sobre uma mesma questão ou problemática. No post anterior, divulgamos artigo do escritor e juiz Marcelo Semer propondo uma reforma urbana para evitar que se repitam tragédias como a que se desenrola na região serrana do estado do Rio de Janeiro.

Agora reproduzimos artigo do teólogo, filósofo e ambientalista Leonardo Boff, que para a mesma problemática vê uma saída bem mais profunda, radical e ambiciosa: uma mudança interna em cada um de nós para que possamos transformar nosso olhar e nossa relação com a mãe natureza.



O preço de não escutar a natureza


Leonardo Boff - Filósofo/Teólogo


O cataclisma ambiental, social e humano que se abateu sobre as três cidades serranas do Estado do Rio de Janeiro, Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo, na segunda semana de janeiro, com centenas de mortos, destruição de regiões inteiras e um incomensurável sofrimento dos que perderam familiares, casas e todos os haveres tem como causa mais imediata as chuvas torrenciais, próprias do verão, a configuração geofísica das montanhas, com pouca capa de solo sobre o qual cresce exuberante floresta subtropical, assentada sobre imensas rochas lisas que por causa da infiltração das águas e o peso da vegetação provocam frequentemente deslizamentos fatais.


Culpam-se pessoas que ocuparam áreas de risco, incriminam-se políticos corruptos que distribuíram terrenos perigosos a pobres, critica-se o poder público que se mostrou leniente e não fez obras de prevenção, por não serem visíveis e não angariarem votos. Nisso tudo há muita verdade. Mas nisso não reside a causa principal desta tragédia avassaladora.


A causa principal deriva do modo como costumamos tratar a natureza. Ela é generosa para conosco pois nos oferece tudo o que precisamos para viver. Mas nós, em contrapartida, a consideramos como um objeto qualquer, entregue ao nosso bel-prazer, sem nenhum sentido de responsabilidade pela sua preservação nem lhe damos alguma retribuição. Ao contrário, tratamo-la com violência, depredamo-la, arrancando tudo o que podemos dela para nosso benefício. E ainda a transformamos numa imensa lixeira de nossos dejetos.




Pior ainda: nós não conhecemos sua natureza e sua história. Somos analfabetos e ignorantes da história que se realizou nos nossos lugares no percurso de milhares e milhares de anos. Não nos preocupamos em conhecer a flora e a fauna, as montanhas, os rios, as paisagens, as pessoas significativas que aí viveram, artistas, poetas, governantes, sábios e construtores.

Somos, em grande parte, ainda devedores do espírito científico moderno que identifica a realidade com seus aspectos meramente materiais e mecanicistas, sem incluir nela a vida, a consciência e a comunhão íntima com as coisas que os poetas, músicos e artistas nos evocam em suas magníficas obras. O universo e a natureza possuem história. Ela está sendo contada pelas estrelas, pela Terra, pelo afloramento e elevação das montanhas, pelos animais, pelas florestas e pelos rios. Nossa tarefa é saber escutar e interpretar as mensagens que eles nos mandam. Os povos originários sabiam captar cada movimento das nuvens, o sentido dos ventos e sabiam quando vinham ou não trombas d’água. Chico Mendes com quem participei de longas penetrações na floresta amazônica do Acre sabia interpretar cada ruído da selva, ler sinais da passagem de onças nas folhas do chão e, com o ouvido colado ao chão, sabia a direção em que ia a manada de perigosos porcos selvagens. Nós desaprendemos tudo isso. Com o recurso das ciências lemos a história inscrita nas camadas de cada ser. Mas esse conhecimento não entrou nos currículos escolares nem se transformou em cultura geral. Antes, virou técnica para dominar a natureza e acumular.

No caso das cidades serranas: é natural que haja chuvas torrenciais no verão. Sempre podem ocorrer desmoronamentos de encostas. Sabemos que já se instalou o aquecimento global que torna os eventos extremos mais freqüentes e mais densos. Conhecemos os vales profundos e os riachos que correm neles. Mas não escutamos a mensagem que eles nos enviam que é: não construir casas nas encostas; não morar perto do rio e preservar zelosamente a mata ciliar. O rio possui dois leitos: um normal, menor, pelo qual fluem as águas correntes e outro maior que dá vazão às grandes águas das chuvas torrenciais. Nesta parte não se pode construir e morar.

Estamos pagando alto preço pelo nosso descaso e pela dizimação da mata atlântica que equilibrava o regime das chuvas. O que se impõe agora é escutar a natureza e fazer obras preventivas que respeitem o modo de ser de cada encosta, de cada vale e de cada rio.
Só controlamos a natureza na medida em que lhe obedecemos e soubermos escutar suas mensagens e ler seus sinais. Caso contrário teremos que contar com tragédias fatais evitáveis.

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