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sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A surreal magistratura brasileira

Rir pra não chorar... 


Juiz de Direito diz que homem que mata a mulher não é perigoso, porque ele quis matar "só" a mulher dele...

Juiz de Direito José Armando da Silveira, da vara do Tribunal do Júri de Juiz de Fora, em entrevista à TV Panorama, domingo, 31/7/2011


EXTREMO ABSURDO

A entrevista foi anunciada para discutir a nova Lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011, que modificou o Código de Processo Penal no atinente à prisão processual, fiança, liberdade provisória, medidas cautelares, etc.

Como todo cidadão de bom senso, aprovo a lei, não só por se tratar de um mecanismo legal de "civilizar" as nossas prisões, como também tornar a pena privativa de liberdade como uma solução para a violência e não um estímulo como é aplicada até o momento, sendo usada a torto e a direito, principalmente contra os pobres deste país.

O que vemos hoje? Pessoas presas por serem pobres e negras. É o primeiro requisito. O motivo, o "crime" vem depois. Diante desse quadro de injustiça, ficamos esperançosos com a nova lei, de que ela possa estancar tanta injustiça com nossa população mais carente.

Daí que, não só eu, mas outras pessoas que assistiram ao programa, ficamos "em choque" ao ouvirmos um juiz de Direito citar como exemplo, num canal de televisão, que a lei liberaria o acusado que matou a mulher porque ele não é perigoso, ele "só" matou a mulher... (completo acima).

Os únicos que a lei não deveria atingir seriam os que tiram a vida, os que matam, seja por quaisquer razões. Sempre pensei que deveria haver um artigo, uma lei, um tratamento, seja o que for, específico, para quem mata. Nenhuma razão, nenhum motivo (torpe ou não) deveria liberar o assassino do cumprimento da sua pena. Por quê? Por causa do exemplo.

Esta é a minha posição: prisão só para quem mata, porque uma vez tirando a vida, comete-se o mais irredutível e covarde dos crimes.

E, no entanto, vem esse juiz dar um péssimo exemplo para a população, neste país onde dezenas de milhares de mulheres são mortas todos os anos por seus maridos ou companheiros, ao dizer que homens que matam suas mulheres não são perigosos, que esses assassinos estão entre os que a lei protege, porque eles "só" matam suas mulheres, não matam a mulher do vizinho.

Não, é surreal! Belisquei-me para acreditar que ouvia tal absurdo.


Significa, então, que essa é a posição do Judiciário?

Um juiz de direito, um representante do Judiciário, com essa declaração absurda, enviou um recado aos homens: você tem direito de matar a "sua" mulher.

Está explicada a matança de mulheres neste país.

O Judiciário é o maior responsável.

Como na frase do pensador polonês S. Jerzy Lec: "Todos somos iguais perante a lei, mas não perante os encarregados de fazê-la cumprir."


Comentário de Vera Vassouras:

Não observo qualquer absurdo no depoimento do juiz. Afinal, não são os Tribunais de todo o mundo demo-crático os autores de assassinatos "seletivos" aos quais se dá o nome de "sentenças", "decisões", "justiça"? Um dia, as viúvas, os órfãos, os despossuídos, os marginalizados, os ofendidos, enfim, a memória dos assassinatos produzidos pelo Judiciário estarão tão evidentes que os cegos não poderão mais fingir que não vêem, os surdos, que não ouvem, e os humanos, que não sentem (lá no fundo da alma) essa barbárie orientada ao direito de matar os mais frágeis. Enfim, o Judiciário mata, afirmando cumprir a lei e os Estados produzem genocídios generalizados, inclusive por meio de guerras, afirmando cumprir "determinações judiciais". A Instituição é assassina desde as origens. Afirmei: desde as origens. Quem tenha olhos, que veja!

Vera Vassouras é Mestra em Filosofia do Direito pela USP, advogada, professora universitária, tradutora, escritora, autora do livro O mito da igualdade jurídica - notas críticas sobre a igualdade formal.


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2 comentários:

  1. Pois é... Eles mesmos se entregam... Basta ter olhos pra ver e ouvidos pra ouvir. Acorda, povo brasileiro! E abra a boca cidadã! Abraços.

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