Lutar com as palavras é a luta mais vã.
No entanto, lutamos, mal rompe a manhã...
No meio do caminho, tinha uma pedra.
Tinha uma pedra no meio do caminho.
Carlos Drummond de Andrade
A história de vida da cidadã blogueira que edita os blogs "Abra a Boca, Cidadão!" e "Psicopatas" começa num pequeno e humilde bairro da periferia leste da cidade de São Paulo, filha caçula de uma família modesta.
Geralda e José, os pais da escritora e blogueira, não tinham sequer completado o curso primário. Mas a menina, aos oito anos, ao ser indagada por um coleguinha de travessuras sobre o que queria ser quando crescesse, não hesitou: "Escritora!"
De onde a menina tirou esta ideia, nem ela sabe...
A família humilde, com pouca instrução e dinheiro curto, não podia comprar livros. O seu José, nordestino das Alagoas, operário de indústria química e torcedor fanático do tricolor paulista e da seleção brasileira, vez por outra, trazia para casa um exemplar da Gazeta Esportiva e do Diário da Noite. E a menina que queria ser escritora se deslumbrava com as letras impressas no papel-jornal, dias e dias devorando aquelas deliciosas e mágicas guloseimas.
Mas a "fome" das letras só fazia aumentar. E foi sendo atendida nos anos seguintes e pela vida afora. E jamais foi saciada.
A menina cresceu, foi cursar o ginásio num bairro operário, e lá teve um fascinante e inesquecível contato com a poesia. Enquanto suas amiguinhas batiam bola na quadra, brincavam no pátio ou fumavam no banheiro, a menina que queria ser escritora, na biblioteca da escola pública, descobriu os românticos e parnasianos, as estrofes, as métricas e as rimas... e declarou para si mesma, extasiada, falando baixinho: "Eu também quero!"
A partir daí a adolescente passou a "cometer" seus primeiros poemas. E o que era "degustação de guloseima" virou transe.
E a "fome" de letras, palavras, poesia, literatura, escritos, textos... não dava trégua.
A menina virou moça e foi parar na melhor universidade brasileira. E desembarcou, claro, num curso de Letras, onde pôde ao longo de anos tentar suprir a esquisita "carência alimentar".
Só a poesia e a ficção não saciavam a fome da menina. E ela foi abrindo outros "cardápios", no jornalismo, na história dos meios impressos, nas artes gráficas, na editoração...
A menina virou Mulher das Letras, dos Livros e da Comunicação. E acabou desempenhando papeis em várias "cozinhas editoriais", revisando, redigindo, editando. No mágico ofício de transformar letras e palavras em iguarias literárias e objetos de degustação.
Livros e mais livros. Autores e mais autores. Textos e mais textos.
Mais de trinta anos percorridos no meio editorial, no Mundo da Cultura.
No entanto, graças a um desses percalços que a vida muitas vezes costuma apresentar, sem que tivesse qualquer interesse ou inclinação, sem que tivesse pedido ou sido consultada, a menina escritora, agora Mulher das Letras e da Comunicação, se vê colocada dentro de um confronto, de um embate irracional, injusto, desproporcional.
Um embate covarde com o Mundo do Crime.
Retrato de Jeanne Pontillon (Leitura), de Berthe Morisot,
pintora impressionista francesa (1888)
(Publicado originalmente, com pequenas mudanças, em 5 de setembro de 2013.)
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