DIREITOS HUMANOS
Há mulheres e mulheres.
As canalhas, passam a vida se dedicando a vigarices, golpes e crimes. Estas são as dispensáveis.
E há as imprescindíveis: corajosas, dignas, aguerridas. Dedicam suas vidas à sociedade, à defesa dos mais frágeis.
Valdênia Aparecida Paulino Lanfranchi: cidadã brasileira, sobrevivente de atentados.
Ativista de direitos humanos, advogada, professora universitária.
E Ouvidora da Polícia na Paraíba.
Prêmio Nacional de Direitos Humanos em 2012.
Uma das mais extraordinárias mulheres deste país. Vivendo o tempo todo sob risco de morte.
Instituições do Estado Brasileiro: protejam esta mulher! Não permitam que ela se torne uma nova Patrícia Acioli...
Valdênia, um metro e meio de atrevimento
Fernanda Abreu
Fernanda Abreu
Valdênia Paulino/Foto: Arquivo pessoal
Valdênia Paulino Lanfranchi, a primeira ouvidora de polícia na Paraíba, é uma pessoa sem papas na língua e sem rugas no pensamento. Ela chega esclarecendo: "A maior parte dos policiais militares e civis é séria. É gente que trabalha duro. Porém, alguns extrapolam o poder da função e se tornam criminosos. A Ouvidoria existe para que a população possa denunciar abusos e se proteger dos maus policiais".
Valdênia está no cargo faz um ano e meio. Ela foi indicada pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba. A Ouvidoria de Polícia é vinculada à Secretaria de Segurança. "Eu e minha equipe estamos fazendo um bom trabalho. Antes, 80% das denúncias vinham por telefone. Hoje, 45% delas são presenciais. As pessoas vêm até nós. Isso significa que a população está confiante no trabalho da Ouvidoria", ela comemora.
As principais denúncias contra policiais são de assassinato, tortura, corrupção, envolvimento com traficantes, formação de milícias. "Mas também companheiras e esposas de policiais nos procuram para relatar situações de violência doméstica. Ou seja, é um caldo em que o ingrediente principal é o machismo. O sujeito se acha o máximo porque tem um pênis e uma arma", Valdênia desabafa. Como é comum acontecer, muitas mulheres vítimas de violência recuam quando se fala em processar judicialmente o agressor. "Damos apoio para as que querem levar a denúncia adiante. A gente encaminha a mulher para um Centro de Referência e acompanha os passos do processo. Sempre digo, um homem agressor já é perigoso, um agressor armado é muito mais", ela pontua.
Valdênia mora em João Pessoa desde 2009. Veio com o marido Renato Lanfranchi, um ex-padre de origem italiana. Ela conta: "Renato também é um batalhador pelos direitos humanos. Daí a gente se entende às mil maravilhas e sempre roubamos um tempinho para namorar. Isso dá salubridade ao nosso cotidiano muito carregado. Todo mundo que trabalha com a promoção e a defesa dos direitos humanos sofre de estresse intenso. Sabe por quê? Porque o Brasil ainda é um grande violador de direitos." A ouvidora fala com propriedade, pois está metida na defesa dos mais pobres e vulneráveis desde sua adolescência. "Eu nasci em 1967. Com quinze anos já fazia trabalhos nas favelas de Sapopemba [São Paulo]. Também já acompanhei a dor de inúmeras mães. Vi muito menino ser morto pela Rota, ou por traficantes. Também testemunhei a comunidade ter muitas vitórias, mas sempre a partir da luta. Nenhuma conquista vem de graça", explica.
Formada em Direito, com mestrado na PUC de São Paulo, Valdênia leciona em duas faculdades de João Pessoa. Ela acredita ser fundamental formar jovens advogados com valores democráticos e éticos. "Ainda são poucos os advogados dispostos a ir para a linha de frente. Isto é, trabalhar ao lado e em conjunto com as pessoas mais desfavorecidas. Aquelas que carecem de dinheiro, educação, trabalho, lazer. Não obstante os avanços contra a pobreza no Brasil, ainda há cidadãs e cidadãos desrespeitados", diz a professora. Ousada, ela ajudou a organizar o grupo de Mães da Paraíba. São mulheres que tiveram seus filhos assassinados sem que ninguém fosse responsabilizado. "A dor dessas mães nunca acaba. Mas poderia ser minimizada se os assassinos de seus filhos pagassem pelo que fizeram. Quando a justiça é feita, o coração serena", ela reflete.
Pequena grande guerreira
Modesta, Valdênia pouco fala dos vários Prêmios e Menções Honrosas que recebeu por seu trabalho na área dos Direitos Humanos. Ela foi agraciada no Brasil e no exterior. "Eu me defino como uma promotora de direitos. Fiz isso por toda a minha vida. Nunca me calei, ou abaixei a cabeça para a prepotência de maus policiais, maus juízes, ou bandidos", ela deixa claro. Tal coragem tem seu preço. Hoje a ouvidora de polícia da Paraíba conta com escolta de segurança, devido às ameaças ao seu local de trabalho e a sua vida. "Trabalhando na Ouvidoria de Polícia, contrariamos muitos interesses. Por exemplo, interesses de criminosos organizados. Essa gente que se acostumou a viver na impunidade, a fazer o que bem entende. Aí, de repente, eles percebem que vamos criar obstáculos, vamos averiguar e, na medida do possível, responsabilizá-los pelos malfeitos", ela conclui.
Amigos e familiares de Valdênia temem por um atentado a sua vida. Mas quem a conhece sabe que esta mulher não tem medo de meter a mão em vespeiro. A comunidade de Sapopemba, na zona leste de São Paulo, coleciona histórias da coragem de Valdênia. São inúmeras. Ela lutou por transporte, habitação, saneamento básico, escolas, geração de empregos, justiça. Sempre pôs a cara para bater. Uma vez parou na frente de um trator que se movimentava para derrubar uma casa em um assentamento. O tratorista desistiu de ir em frente. Algumas vezes ela acabou presa. Numa delas, o delegado ao ver a moça franzina, de um metro e meio de altura, exclamou surpreso: "Mas esta é a perigosa Valdênia? Eu imaginava que fosse uma mulher enorme!"
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Valdênia está no cargo faz um ano e meio. Ela foi indicada pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba. A Ouvidoria de Polícia é vinculada à Secretaria de Segurança. "Eu e minha equipe estamos fazendo um bom trabalho. Antes, 80% das denúncias vinham por telefone. Hoje, 45% delas são presenciais. As pessoas vêm até nós. Isso significa que a população está confiante no trabalho da Ouvidoria", ela comemora.
As principais denúncias contra policiais são de assassinato, tortura, corrupção, envolvimento com traficantes, formação de milícias. "Mas também companheiras e esposas de policiais nos procuram para relatar situações de violência doméstica. Ou seja, é um caldo em que o ingrediente principal é o machismo. O sujeito se acha o máximo porque tem um pênis e uma arma", Valdênia desabafa. Como é comum acontecer, muitas mulheres vítimas de violência recuam quando se fala em processar judicialmente o agressor. "Damos apoio para as que querem levar a denúncia adiante. A gente encaminha a mulher para um Centro de Referência e acompanha os passos do processo. Sempre digo, um homem agressor já é perigoso, um agressor armado é muito mais", ela pontua.
Valdênia mora em João Pessoa desde 2009. Veio com o marido Renato Lanfranchi, um ex-padre de origem italiana. Ela conta: "Renato também é um batalhador pelos direitos humanos. Daí a gente se entende às mil maravilhas e sempre roubamos um tempinho para namorar. Isso dá salubridade ao nosso cotidiano muito carregado. Todo mundo que trabalha com a promoção e a defesa dos direitos humanos sofre de estresse intenso. Sabe por quê? Porque o Brasil ainda é um grande violador de direitos." A ouvidora fala com propriedade, pois está metida na defesa dos mais pobres e vulneráveis desde sua adolescência. "Eu nasci em 1967. Com quinze anos já fazia trabalhos nas favelas de Sapopemba [São Paulo]. Também já acompanhei a dor de inúmeras mães. Vi muito menino ser morto pela Rota, ou por traficantes. Também testemunhei a comunidade ter muitas vitórias, mas sempre a partir da luta. Nenhuma conquista vem de graça", explica.
Formada em Direito, com mestrado na PUC de São Paulo, Valdênia leciona em duas faculdades de João Pessoa. Ela acredita ser fundamental formar jovens advogados com valores democráticos e éticos. "Ainda são poucos os advogados dispostos a ir para a linha de frente. Isto é, trabalhar ao lado e em conjunto com as pessoas mais desfavorecidas. Aquelas que carecem de dinheiro, educação, trabalho, lazer. Não obstante os avanços contra a pobreza no Brasil, ainda há cidadãs e cidadãos desrespeitados", diz a professora. Ousada, ela ajudou a organizar o grupo de Mães da Paraíba. São mulheres que tiveram seus filhos assassinados sem que ninguém fosse responsabilizado. "A dor dessas mães nunca acaba. Mas poderia ser minimizada se os assassinos de seus filhos pagassem pelo que fizeram. Quando a justiça é feita, o coração serena", ela reflete.
Pequena grande guerreira
Primeira ouvidora mulher de polícia na Paraíba. Foto: Arquivo pessoal
Modesta, Valdênia pouco fala dos vários Prêmios e Menções Honrosas que recebeu por seu trabalho na área dos Direitos Humanos. Ela foi agraciada no Brasil e no exterior. "Eu me defino como uma promotora de direitos. Fiz isso por toda a minha vida. Nunca me calei, ou abaixei a cabeça para a prepotência de maus policiais, maus juízes, ou bandidos", ela deixa claro. Tal coragem tem seu preço. Hoje a ouvidora de polícia da Paraíba conta com escolta de segurança, devido às ameaças ao seu local de trabalho e a sua vida. "Trabalhando na Ouvidoria de Polícia, contrariamos muitos interesses. Por exemplo, interesses de criminosos organizados. Essa gente que se acostumou a viver na impunidade, a fazer o que bem entende. Aí, de repente, eles percebem que vamos criar obstáculos, vamos averiguar e, na medida do possível, responsabilizá-los pelos malfeitos", ela conclui.
Amigos e familiares de Valdênia temem por um atentado a sua vida. Mas quem a conhece sabe que esta mulher não tem medo de meter a mão em vespeiro. A comunidade de Sapopemba, na zona leste de São Paulo, coleciona histórias da coragem de Valdênia. São inúmeras. Ela lutou por transporte, habitação, saneamento básico, escolas, geração de empregos, justiça. Sempre pôs a cara para bater. Uma vez parou na frente de um trator que se movimentava para derrubar uma casa em um assentamento. O tratorista desistiu de ir em frente. Algumas vezes ela acabou presa. Numa delas, o delegado ao ver a moça franzina, de um metro e meio de altura, exclamou surpreso: "Mas esta é a perigosa Valdênia? Eu imaginava que fosse uma mulher enorme!"
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