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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Ainda sobre a condenação do Brasil na CIDH/OEA

Sobre a condenação do Estado brasileiro na Corte Interamericana de Direitos Humanos, o ABC! continua publicando posts de cujos pontos de vista, estilo e tom compartilha. Abaixo, dois textos do jornalista e revolucionário Celso Lungaretti, postados em seu blog Náufrago da Utopia: "Anistia não beneficiou torturadores, diz Corte da OEA" e "Sentença histórica pulverizou falácias das viúvas da ditadura".


quarta-feira, 15 de dezembro de 2010


ANISTIA NÃO BENEFICIOU TORTURADORES, DECIDE CORTE DA OEA


Foi exemplar a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos (vinculada à OEA), que, 15 anos após a apresentação da denúncia por parte de ONG's defensoras dos DH, finalmente condenou o Brasil pelo "desaparecimento forçado" de 62 inimigos da ditadura militar, assassinados durante a repressão à guerrilha do Araguaia, na década de 1970.

Sabe-se que muitos foram aprisionados com vida e covardemente executados tendo as forças repressivas dado sumiço nos seus restos mortais.

Além desses 62 guerrilheiros seguramente mortos, a Corte afirmou existirem pelo menos mais oito desaparecidos no confronto.

De acordo com a sentença:
  • contrariamente à aberrante decisão do Supremo Tribunal Federal, a anistia de 1979 não desobriga o Estado brasileiro da apuração desses casos, pois suas disposições "carecem de efeitos jurídicos e não podem seguir representando um obstáculo para a investigação", "nem para a identificação e punição dos responsáveis" pelas mortes;
  • a Lei de Anistia também não garante a impunidade dos responsáveis por "outros casos de graves violações de direitos humanos" durante a ditadura de 1964/85;
  • o Estado brasileiro é "responsável pelo desaparecimento forçado" dos guerrilheiros mortos;
  • deverá, portanto, promover uma investigação sobre os desaparecimentos, "a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei preveja";
  • também lhe cabe desenvolver "todos os esforços" para encontrar ossadas dos combatentes, realizar um "ato público de reconhecimento de suas responsabilidades" e criar "um programa ou curso permanente e obrigatório sobre direitos humanos", dirigido a "todos os níveis hierárquicos das Forças Armadas".
Finalmente, a sentença estimula a implementação da Comissão Nacional da Verdade, proposta do Programa Nacional dos Direitos Humanos que até agora não saiu do papel.

O Itamaraty confirmou que, pelas regras do direito internacional, o Brasil, na condição de signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, é obrigado a cumprir a decisão.

Já o ministro da Defesa Nelson Jobim, manifestando-se sempre como representante da caserna e não do governo, levantou a possibilidade de o Brasil invocar a Lei de Anistia para continuar acobertando os culpados.

Ou seja, agora está também na contramão do Direito internacional, comprovando que sua manutenção na Pasta foi a pior de todas as escolhas ministeriais de Dilma Rousseff.


Quanto ao STF, ficou com a imagem em cacos, ao receber um puxão de orelhas explícito de uma corte internacional. Suas presidências reacionárias  -- a anterior e a atual -- o desmoralizam e nos desmoralizam aos olhos do mundo.

 

NA PRÁTICA, A MORTE CHEGA ANTES

Mesmo que, em termos práticos, a decisão tenha chegado tarde demais para que os homicidas e torturadores venham a ser efetivamente punidos -- os remanescentes estão no fim da vida e tendem a beneficiar-se da morosidade e infinitos recursos protelatórios possibilitados pela Justiça brasileira --, pelo menos a página da História será virada como se deve, com os culpados inculpados e as vítimas reconhecidas.

Quem sentir-se futuramente tentado a incorrer nas mesmas práticas hediondas e genocidas, vai estar sabendo que, já existindo um entendimento definitivo e inequívoco da questão, será grande a possibilidade de receber em vida o merecido castigo.

E que teses falaciosas como a da   contrarrevolução preventiva   e a da  anistia recíproca  jamais prevalecerão no longo prazo, acabando por ser varridas juntamente com o restante do entulho autoritário.




quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

SENTENÇA HISTÓRICA PULVERIZOU FALÁCIAS DAS VIÚVAS DA DITADURA

Cezar Peluso, presidente do Supremo Tribunal Federal, desconversou que a condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos "não revoga, não anula e não cassa" a decisão grotesca e aberrante do STF -- a que outorgou aos carrascos de ditaduras o direito de anistiarem previamente a si próprios.

Ora, aquilo nada mais foi do que um habeas corpus preventivo, uma impunidade programada, agredindo os próprios fundamentos do Direito.

Peluso, claro, está falando sozinho. Até o sujeito na esquina -- personagem tão desprezado pelo seu antecessor e companheiro de ideais Gilmar Mendes -- percebe que a corte internacional, na prática, revogou, anulou e cassou o aborto jurídico produzido pelo STF.

Sob vara, o Estado brasileiro será obrigado a fazer agora o que deveria ter feito desde que o País saiu das trevas, em 1985.

De resto, conforme esclareceu o juiz  ad hoc  da corte, Roberto Caldas, tratou-se de "uma sentença histórica, que estabelece que nenhum crime contra os direitos humanos pode ficar impune com base na Lei da Anistia".

Ou seja, afora os guerrilheiros assassinados do Araguaia, "a decisão se aplica a todos os casos de tortura, desaparecimento forçado e execução sumária ocorridos na ditadura".

Como eu ressalvei no meu artigo inicial, seria ingenuidade acreditarmos que ainda veremos os torturadores dos anos de chumbo cumprindo merecidas penas de prisão, prestando serviços à comunidade (desserviços já prestaram de sobra!) ou ressarcindo os cofres públicos pelas indenizações pagas a suas vítimas.

Os que ainda não foram acertar suas contas com o diabo têm idade avançada e dificilmente atravessarão a próxima década. Ora, a Justiça brasileira é letárgica por natureza, além de propiciar um sem-número de subterfúgios,  jeitinhos  e manobras protelatórias para quem pode bancar os melhores advogados. Estão aí o Paulo Maluf e o Pimenta Neves, que não me deixam mentir...

Nossa grande vitória foi moral: toda a retórica falaciosa das viúvas da ditadura e dos  corvos  por elas criados, novos partidários do arbítrio, foi jogada no lixo. Prevaleceu o entendimento civilizado de que a ditadura era uma aberração e os atos que praticou contra seus opositores foram, pura e simplesmente, crimes.

O estabelecido por esta sentença realmente histórica foi o reconhecimento definitivo de que os cidadãos têm o direito e até o dever de pegar em armas contra tiranias.

Criminosos nunca foram nem jamais serão os que resistem ao despotismo, mas sim aqueles que os reprimem, massacram e exterminam para sustentar regimes totalitários, geralmente resultantes da usurpação do poder, como foi o caso da ditadura brasileira de 1964/85.



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